Jornal de Brasília
Quarta-feira, 8/6/94
Revolução das panelas
BIA BOTANA
O crescente individualismo contemporâneo
transformou a sociedade, e hoje até o homern se transfigura de dono de casa,
scm que isso o desmereça em nada. Entretanto, o mesmo conceito aplicado às
mulheres é pejorativo, não obstante grande parte delas cumpram dois turnos de
trabalho: o doméstico desqualificado e o profissional mal remunerado (a mulher
brasileira ganha 55% do salário masculino na mesma função).
As mulheres, ou melhor, as donas de
casa, constituem nos nossos dias mais da metade da população, da força de
trabalho, de chefes de família, de consumidoras e sobretudo do eleitorado do do
País. Nada mais justo que possuam uma representação condigna com o seu papel
social. Quem pode saber mais das agruras do confronto salário “versus"
supermercado? O desempenho feminino, contra a economia inflacionária dos últimos
anos, se notabiliza pela hábil capacidade em superar os desafios de
sobrevivência e de perpetuação da espécie
Íris e Gardênia são dignas representantes
desse segmento social, que vem sofrendo um trato insultante do Estado. A
participação delas no contexto das próximas eleições não é um “afago à vaidade”,
muito menos uma “homenagem” às mulheres,
mas uma situação de direito
reconhecido por lideranças políticas esclarecidas.
As relações femininas com a sociedade
têm trazido a gradativa supressão do autoritarismo masculino em prol de uma
organização de parceria integradora, com resultados mais produtivos e humanos,
que reflete a verdadeira democracia; O ganho conjunto passou a se sobrepor à
competitividade egoística do ganho isolado, expressando o anseio feminino de
maior justiça social. Neste quadro lris e Gardênia possuem larga experiência, não
só pelo devotamento ao lar mas à sociedade.
A acusaçâo de despreparo de ambas
candidatas à vice-presidência, ou mesmo à eventual presidência, é vil discriminação,
já que superam um certo candidato em formação cultural, citando só um único
aspecto. Em verdade melhor seria uma candidatura feminina à Presidência da
República. Mas num país onde ainda a mulher casada necessita a vergonhosa
autorização do marido – “geral ou especial em instrumento público ou
particular previamente autenticado” (Arts. 242, 243, 247 252 do direito de família do Código Civil
Brasileiro) – para
participar da vida pública, não poderia existir uma Thatcher!
Enquanto vigorar um Código Civil retrógrado
que subjuga pelo matrimônio a mulher, em seus direitos civis, políticos,
econômicos e trabalhista, à autoridade
masculina, a expressão de inferioridade social feminina permanecerá. Apesar do
empenho de uma mídia antifeminista, que exarceba a sexualidade da mulher como mercadoria
prostituída, a fim de desviar sua atenção de seus reais intercsses, a luta
feminina não parou. Os “soutiens", queimados em praça pública no passado, acenderam
a chama que ainda queima alimentando uma renovada revolução, que abrange todos
os injustiçados da humanidade. A revoluçáo
das panelas marca a luta feminina pelo livre acesso ao centro de poder,
único caminho que permitirá às mulheres restaurar a própria honra e dignidade,
assim como implantar uma justiça social numa sociedade corrupta e desvirtuada.
Donas de casa, unam-se! Apóiem nossas
representantes políticas, para que possam trazer significativas e benfazejas
mudanças ao Estado brasileiro. A revolução das panelas começa agora nas urnas,
nossa arma poderosa é o voto, unidas, mais uma vez venceremos.
Bia Botana é analísta política
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